domingo, 17 de agosto de 2014

O computador te vê

Uma psicóloga virtual pode ser melhor do que a real


Ellie é uma psicóloga e é muito boa nisso. Sorria pra ela, e ela saberá exatamente o que significa o seu sorriso. Se você tiver um tique nervoso ou demonstrar tensão nos olhos, ela perceberá instantaneamente. Ela ouve o que você diz, processa cada palavra, trabalha o significado do seu discurso, o seu tom de voz, sua postura, tudo. Ela está no topo da sua área mas, de acordo com um novo estudo, seu maior trunfo é que ela não é humana. 

Quando confrontados com perguntas difíceis ou potencialmente embaraçosas, as pessoas muitas vezes não dizem aos médicos o que eles precisam ouvir. No entanto, os pesquisadores por trás de Ellie, liderados por Jonathan Gratch, do Instituto de Tecnologias Criativas em Los Angeles, após anos monitorando interações humanas com computadores, desconfiam que as pessoas podem estar mais dispostas a falar diante de um avatar. Para testar essa ideia, eles colocaram 239 pessoas na frente de Ellie (foto acima) para ter uma conversa com ela sobre suas vidas. Para metade delas, foi dito (sinceramente) que elas estariam interagindo com uma inteligência artificial; os outros foram informados (falsamente) que Ellie era um pouco como um boneco, que tinha suas cordas puxadas remotamente por uma pessoa. 

Projetada para investigar problemas psicológicos, Ellie trabalhou com cada participante no estudo da mesma maneira. Ela começou cada entrevista com perguntas de construção de relacionamento, tais como: "De onde você é?". Prosseguiu então com perguntas mais clinicamente orientadas, como: "É fácil para você ter uma boa noite de sono?" Terminou, enfim, com perguntas destinadas a melhorar o humor dos participantes, por exemplo, "Do que você mais se orgulha?". Ao longo da experiência, ela realizou um relevante seguimento de perguntas - "você pode me dizer mais sobre isso?", por exemplo, desempenhando ainda os gestos e expressões faciais apropriadas. 

Deite no sofá, por favor
Durante seu tempo com Ellie, todos os participantes tiveram seus rostos digitalizados em busca de sinais de tristeza, e receberam uma pontuação que varia de zero (nenhum indicador) a um (indicando um alto grau de tristeza). Além disso, três, psicólogos humanos reais, que desconheciam o propósito do estudo, analisaram as transcrições das sessões, para avaliar a disposição dos participantes em revelar suas informações pessoais. 

Os observadores foram solicitados a analisar as respostas de questões sensíveis e íntimas, tais como: "Como está sua proximidade em relação à família?" E "Conte-me sobre a última vez em que você se sentiu muito feliz". Eles classificaram as respostas numa escala de sete pontos, variando de -3 (indicando uma falta de vontade completa de revelar informações) a +3 (indicando uma completa disposição). Todos os participantes foram também convidados a preencher questionários destinados a investigar como se eles se sentiram sobre a entrevista. 

Dr Gratch e seus colegas relatam em Computers in Human Behavior (Computadores com Comportamento humano) que, embora todos tenham interagido com o mesmo avatar, suas experiências foram notavelmente diferentes com base no que eles achavam que estavam lidando. Aqueles que pensavam que Ellie estava sob o controle de um operador humano relataram maior medo de divulgar informações pessoais, e disseram controlar com mais cuidado o que diziam durante a sessão, do que aqueles que acreditavam que estavam simplesmente interagindo com um computador. 

 O ponto crucial é que os psicólogos que analisaram os pacientes, perceberam que aqueles que achavam que estavam lidando com um ser humano eram de fato menos abertos, com média de 0,56 em comparação com pontuação média de 1,11 do outro grupo. O primeiro grupo também manifestou menos sinais de tristeza, com média de 0,08 em comparação com 0,12 pontuação tristeza do outro grupo. 

 Dr. Gratch acredita que essa qualidade de encorajar abertura e honestidade será de particular valor na avaliação dos problemas psicológicos dos soldados - um ponto de vista compartilhado pela Agência de Projetos de Pesquisa em Defesa Avançada dos Estados Unidos, que está ajudando a custear o projeto. 

Soldados são recompensados por serem durões, e muitos evitam a todo custo ir ao psicólogo. Isso significa que problemas como o transtorno de estresse pós-traumático (PTSD), ao qual homens e mulheres militares estão particularmente propensos, muitas vezes podem tornar-se perigosos antes de serem descobertos. Ellie poderia mudar as coisas para melhor, de forma confidencial, informando soldados com PTSD que ela sente que eles poderiam ser um risco para si e para os outros, e aconselhá-los sobre como procurar tratamento. 

Mas isso somente se os soldados puderem se convencer de que Ellie não é realmente um psicólogo humano disfarçado. Porque se Ellie pode se passar por humana, provavelmente um ser humano pode se passar por Ellie. 



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